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Archive for the ‘Uncategorized’ Category

por Adolfo Ferraz

Já ganhei o centrão de São Paulo, uma de boca de porco que chamo de minha casa. É nestas ruas imundas, de gente suja, que durmo e faço minhas refeições diárias. Acostumei-me. Não tenho a menor esperança de um dia sair da calçada ladrilhada para repousar minha cabeça em um travesseiro frio e esticar-me numa cama de pau. O chafariz da Praça da Sé é a banheira dos meus sonhos; a porta do Metrô é o meu reduto. Cheguei à conclusão de que o conforto chega só para alguns. Talvez, tivesse eu o azar de ter nascido.

Sou filho do mundo, vim do nada e para o nada eu voltarei. Descobri, com o tempo, que minha procriadora é uma máquina de fazer filhos, e depois os divide nos grandes faróis do inferno. A cola, o craque e a maconha são as sobremesas em fartura – o cigarro não faz mais efeito. Duas vezes por mês, consigo um extra.

Extra, aqui, é o meio mais fácil de levantar uma grana para comermos o comercial. Sim, me prostituo; furto e roubo sempre que necessários. É o que tem pra hoje. Não perco tempo ouvindo mentiras que os nossos políticos nos fazem engolir. Isso não me alimenta. O que supri a minha fome são os restos, tudo o que vem do lixão. Sou castigado desde que nasci, e até hoje não sei o porquê.

Gostaria muito, pelo menos por um dia, de ter a oportunidade de deixar de ser um animal neste mundo cão e poder desfrutar de tudo o que um ser humano tem direito. Como se isto me pertencesse! Bem, vou-me agora. A barriga ronca e o lixo me chama. Apesar de tudo, sobrevivo porque ainda acredito que esse desfecho pode ser digno.

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